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quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Um presente para a alma e para a inteligência: GUIMARÃES ROSA


"Quando escrevo, repito o que já vivi antes.E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente.Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser um crocodilo porque amo os grandes rios,pois são profundos como a alma de um homem.Na superfície são muito vivazes e claros,
mas nas profundezas são tranqüilos e escuros como o sofrimento dos homens."



Era médico, diplomata, poliglota, conforme um dia disse a uma prima, estudante, que fora entrevistá-lo:

“Falo: português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano,esperanto, um pouco de russo; leio: sueco, holandês, latim e grego (mas com o dicionário agarrado); entendo alguns dialetos alemães; estudei a gramática: do húngaro, do árabe,do sânscrito, do lituânio, do polonês, do tupi, do hebraico, do japonês, do tcheco, do finlandês, do dinamarquês; bisbilhotei um pouco a respeito de outras. Mas tudo mal. E acho que
estudar o espírito e o mecanismo de outras línguas ajuda muito à compreensão mais profunda do idioma nacional.
Principalmente, porém, estudando-se por divertimento, gosto e distração.”

domingo, 22 de agosto de 2010

Boa Prova, queridos...e queridas!




... que um dia vocês se armem de coragem e tenham a ousadia de sair em busca da Ilha Desconhecida! Vai valer a pena, acreditem.

Beijos.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

A Ilha Desconhecida : um desafio.



No conto da Ilha Desconhecida há momentos de profundidade que aparentam serem superficiais. Os personagens são muito mais um retrato de suas funções sociais do que de suas características físicas. Assim, o personagem principal, o desbravador de ilhas, é caracterizado apenas como o homem que queria um barco, o homem que tinha um barco ou o homem do leme, e a sua companheira como a mulher da limpeza.

Porém, no decorrer da história, a aparente simplicidade dos personagens se contrasta com a profundidade de seus pensamentos. Talvez a iniciativa de recorrer às funções dos personagens,marcando sua posição hierárquica, transpareça no enredo como uma articulação necessária para retratar a sociedade resultante de um sistema marcado
pelas desigualdades.

Logo no início do conto aparece a questão da hierarquia social, que vai do rei (topo do poder) que estava sempre ocupado na porta das obséquias porque estes eram bem vindos, enquanto as petições não eram resolvidas,passa por vários outros subordinados até chegar à mulher da limpeza, (essa burocracia nos serviços mostra um governo distante de seu maior objetivo:promover o bem-estar do povo), e no momento em que o homem “manda” chamar o rei, e este atende ( por curiosidade), começa uma desordem nesta hierarquia.

Quando o rei desconcertado, por causa do “atrevimento”do homem, senta-se na cadeira de palhinha usada pela mulher da limpeza,que era muito mais baixa e desconfortável que o trono, passa a haver uma aproximação da realeza com o povo, representado aí pelo homem do barco.

O homem estava diante de uma ordem social pronta para dizer não, mas ele apresentou bons argumentos e ,no momento em que o rei disse que não daria o barco, ele -com firmeza e convicção -falou: “Darás”. O rei percebeu que aquele homem era como um instrumento que poderia causar transformações sociais, ainda que primeiro em plano pessoal, mas, posteriormente, com uma inclinação perceptível ao coletivo, por isso, diante da pressão popular e para evitar maiores aborrecimentos, consentiu em atendê-lo, pois assim continuava com a coroa na cabeça, sendo O Rei.

O poder de convencimento do homem em relação à autoridade real foi tão contundente, quanto sua certeza da existência da ilha. Percebemos que para iniciar o processo de descoberta e transformação é necessário que se derrubem algumas barreiras, até mesmo aquelas que parecem estar muito acima de nós.

Após a quebra do obstáculo da posição social, vem a parte mais difícil de sua jornada: a busca da ilha desconhecida. Saramago, através desse conto, faz uma metáfora da necessidade de fazermos a nossa própria viagem em direção a nós mesmos, e traz o passado até nós, lembrando o período das grandes navegações para representar o sentido das descobertas humanas, a busca de si mesmo, de seu mundo interior, ir onde nenhum outro jamais estivera e descobrir verdades profundas escondidas na alma. E seja lá onde se consegue ir, mesmo se a viagem for bruscamente interrompida pela morte, a algum lugar se chega.

“Sim, às vezes naufraga-se pelo caminho, mas, se tal me viesse a acontecer,
deverias escrever nos anais do porto que o ponto a que cheguei foi
esse, Queres dizer que chegar sempre se chega,...”
(SARAMAGO, 1998,
p.27).

O homem do barco procurou ajuda de marinheiros, mas ninguém quis ajudá-lo, porque sair de suas vidas tranquilas e meter-se à procura do “impossível”,enfrentar o mar tenebroso, era tarefa difícil. Seriam necessárias muita coragem e obstinação para ser aventureiro a desbravar novas terras. Mas ele conta com a ajuda de uma mulher (a mulher da limpeza), que resolve sair do palácio pela porta das decisões e passa a acompanhá-lo nessa busca.

“Pensou ela que já bastava de uma vida a limpar e a lavar palácios, que tinha chegado à hora de mudar de ofício, que lavar e limpar barcos é que era sua vocação verdadeira,no mar, ao menos a água nunca lhe faltaria” (SARAMAGO, 1998,p.24).

Já sabia ela que precisamos estar longe de nós mesmos para podermos enxergar melhor nossa natureza, e que só assim venceremos os obstáculos do caminho , por isso troca sua rotina enfadonha por uma viagem poética em busca de seus sonhos A obsessão do homem contagiara de forma simplista a sensibilidade feminina.

Também é apresentado no texto um processo de recomeço e de renovação,no qual aparece o sonho não como um qualquer, mas mostrando-nos que é preciso navegar para além do real, resistindo às adversidades para que nos tornemos aptos à concretização do sonho e possamos ancorar em porto seguro.

Todos estes fatores que vão das adversidades até o “navegar para o
além do real” permite a aproximação entre o “homem do barco” e a “mulher da
limpeza”, “Acordou abraçado à mulher da limpeza, e ela a ele, confundidos os
corpos”
(SARAMAGO, 1998, p.62), pois do sonho surge o amor, e do amor,
força para enfrentar os pesadelos.

A partir daí os dois passaram não somente a fazerem descobertas exteriores, mas a descoberta de si mesmo.Sabiam eles, agora, que um completaria o outro, que a compreensão das verdades mais profundas, escondidas na alma (como uma ilha) seriam possíveis.

Nomearam o barco que o rei havia lhes dado : “Ilha Desconhecida”, e esta lançou-se enfim ao mar, a procura de si mesma, mostrando que ainda havia muitas descobertas a serem feitas.



OBS:
Saramago é uma "viagem" maravilhosa pela literatura, pela língua portuguesa e um desafio para qualquer leitor que queira aprender e saber mais. OUSE!

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Todo ( ou nenhum )homem é uma ilha (?) ...para reflexão.



John Donne (1572-1631):
Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra; se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos teus amigos ou a tua própria; a morte de qualquer homem diminui-me, porque sou parte do género humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti”.

Saramago :
O filósofo do rei, quando não tinha que fazer, ia sentar-se ao pé de mim, a ver-me passajar as peúgas dos pajens, e às vezes dava-lhe para filosofar, dizia que todo o homem é uma ilha, eu, como aquilo não era comigo, visto que sou mulher, não lhe dava importância, tu que achas, Que é necessário sair da ilha para ver a ilha, que não nos vemos se não nos saímos de nós, Se não saímos de nós próprios, queres tu dizer, Não é a mesma coisa.



O homem que queria um barco, bem como a mulher da limpeza que decide o seguir,
são o elemento diferenciador na narrativa: aqueles que assumem o papel de descontentamento com a realidade presente . São eles, que não possuem o poder e os barcos de domínio do rei, nem o conhecimento e a experiência dos marinheiros, que decidem buscar a ilha desconhecida, não conformados apenas com as que já existiam.

Isso, porque tinham o essencial: a vontade, o despreendimento, o desejo de mudança. Esses dois personagens demonstraram que o passado pode ser lembrado através de diferentes concepções, duas as quais ficam claramente expostas no conto em questão.

Uma, representada através do rei e dos marinheiros, concretizada na estabilidade daquilo que já foi conquistado: “não iriam eles tirar-se do sossego dos seus lares e da boa vida dos seus barcos de carreira para se meterem em aventuras oceânicas, à procura de um impossível.” (SARAMAGO,1998, p.39).

A outra, a qual seguiram, fundamentada não a partir do que outros disseram ser apropriado e mais sensato, mas alicerçada pessoalmente por aquilo em que se acredita, a realidade como resultado da equação entre o que se quer, o que se é e a maneira em que, portanto, acaba-se agindo.

sábado, 7 de agosto de 2010

O autor explica ( muito bem) a obra.



A ilha desconhecida somos nós próprios e, nesse conto, quando se pinta dos lados que o nome da caravela é Ilha Desconhecida, as últimas palavras são: "Com a maré do meio-dia, a caravela partiu à procura de si mesma." E, no fundo, é isso. Nós andamos à procura de nós próprios e essa busca pode tomar vários caminhos.


(SARAMAGO. Acesso em 19/11/06)

domingo, 1 de agosto de 2010

Saramago : porque vale a pena.


Se só nos detivermos a pensar nas pequenas coisas nunca chegaremos a compreender as grandes


Em 18 de Junho de 2010, morreu na Ilha de Lanzarote, o escritor português José Saramago. Tido como um escritor polêmico, Saramago foi um dos mais importantes homens de letras da língua portuguesa do século XX e, talvez, de toda a história.
Nas linhas a seguir, você poderá conferir alguns detalhes sobre a vida e conhecer algumas citações de Saramago.

José Saramago nasceu em Azinhaga em 16 de novembro de 1922 e faleceu na Ilha de Lanzarote (que faz parte das Ilhas Canárias) no dia 18 de junho de 2010.

Além de escritor, José Saramago era jornalista, dramaturgo e poeta.
Venceu o Prêmio Camões (o mais importante da língua portugues e ganhou o prêmio Nobel de literatura.

«Se eu tivesse morrido antes de te conhecer, Pilar, teria morrido sentindo-me muito mais velho. Aos 63 anos, a minha segunda vida começou. Não posso queixar-me. As coisas que você considera importantes não são tão importantes. Eu ganhei um Prémio Nobel. E daí?» ( para Pilar del Rio, jornalista espanhola e sua terceira mulher)

Comunista, Saramago sempre foi um ateu convicto. Seu primeiro emprego foi de serralheiro mecânico. Assim como o brasileiro Carlos Drummond de Andrade, Saramago trabalhou durante muito tempo como funcionário público.

Terra do Pecado, o primeiro livro de Saramago, foi publicado quando ele tinha apenas 25 anos.Após Terra do Pecado, Saramago só viria a publicar outro romance 30 anos depois. Terra do Pecado saiu em 1947 e Manual de Pintura e Caligrafia em 1977.

O escritor foi acusado de anti-semitismo por declarar em uma entrevista a um jornal brasileiro que “os judeus não merecem a simpatia pelo sofrimento por que passaram durante o holocausto”. Na verdade, Saramago tentou criticar a posição de Israel no conflito israelense-palestino.

Ele também foi duramente criticado pela direita norte-americana quando ganhou o prêmio Nobel de literatura, talvez por seu ateísmo e suas posições políticas de esquerda.Saramago foi um grande crítico do Papa Bento XVI na época em que ele respondia apenas por Cardeal Joseph Ratzinger.

Sua mudança de Portugal para as Ilhas Canárias ocorreu, pelo menos em grande parte, por causa das críticas ao livro O Evangelho Segundo Jesus Cristo.


BIBLIOGRAFIA :
Os livros de José Saramago publicado no Brasil são: "O Ano da Morte de Ricardo Reis" (1988), "A Jangada de Pedra" (1988), "História do Cerco de Lisboa (1989), "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" (1991), “Manual de Pintura e Caligrafia” (1992), "In Nomine Dei" (1993), “Objecto Quase” (1994), "Ensaio sobre a Cegueira" (1995), "A Bagagem do Viajante (1996),"Memorial do Convento" (1996), "Cadernos de Lanzarote" (1997), "Todos os Nomes" (1997), "Viagem a Portugal" (1997), "Que Farei com Este Livro?" (1998), "O Conto da Ilha Desconhecida" (1998), "Cadernos de Lanzarote II" (1999), "A Caverna" (2000), "A Maior Flor do Mundo" (2001), "O Homem Duplicado" (2002), "Ensaio sobre a Lucidez" (2004), "As Intermitências da Morte" (2005), "Don Giovanni ou o Dissoluto Absolvido" (2005), "A Jangada de Pedra" (2006, edição de bolso), "As Pequenas Memórias" (2006),"A Viagem do Elefante" (2008), "O Caderno" (2009) e "Caim" (2009).


OBS IMPORTANTE :

O Conto da Ilha Desconhecida in http://www.releituras.com/jsaramago_menu.asp.

Gostar é provavelmente a melhor maneira de ter, ter deve ser a pior maneira de gostar.

(...)mas quero encontrar a ilha desconhecida, quero saber quem sou eu quando nela estiver, Não o sabes, Se não sais de ti, não chegas a saber quem és...

(...) é necessário sair da ilha para ver a ilha, que não nos vemos se não nos saímos de nós.

(...)o sonho é um prestidigitador hábil, muda as proporções das coisas e as suas distâncias, separa as pessoas, e se elas estão juntas, reúne-as...

O livro de Agosto /2010

Esse livro foi escolhido para leitura dos nonos anos em dezembro de 2009.O objetivo era , e é, introduzir o aluno em um texto reflexivo, ousado...Apresentar-lhes um autor que faz parte do mundo-leitor contemporâneo, que nos desafia no processo linguístico e temático. Infelizmente,Saramago " ficou encantado" ( como diria Guimarães Rosa), o que não nos impede de conhecê-lo nesta e em outras obras incríveis.
Que a leitura desse texto seja " a porta" para os demais,porque através deles pode-se saber muito sobre a vida , mas muito mais sobre nós mesmos.

"Buscar a si mesmo" na imagem poética de uma ilha misteriosa, assim como são misteriosos os sonhos humanos, reflete um desejo universal, desde tempos ancestrais.
É filosófico afirmar que "todo homem é uma ilha", e o personagem do conto quer descobrir a si mesmo, o sentido de sua existência.
A ilha desconhecida é a imagem metafórica da consciência, de "o mundo interior". E se somos ilhas, aí está um exercício de autoconhecimento.

http://www.releituras.com/jsaramago_conto.asp - É imprescindível ler mais para tornar-se melhor.