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terça-feira, 26 de abril de 2011

O Alienista : Conclusão


A parábola do texto

..não se fala da loucura ou dos loucos, por mais que o Alienista tente fazê-los atuar. De resto, os loucos e sua loucura são uma presença apaziguadora e até cômica ao longo do texto. Fala-se, isso sim, deste homem e de seu discurso que é capaz de produzir a loucura.

Pois é esta a parábola descrita pelo texto: no início da narrativa, não há loucos em Itaguaí, cidade que tinha o “ruim costume”, segundo o Alienista,“de não fazer caso dos dementes”. Estes, quando mansos, andavam à solta, e,quando furiosos, ficavam trancafiados em casa. De resto, eram poucos e não criavam maiores problemas. Quer dizer: não havia loucos em Itaguaí, não havendo quem levantasse a questão científica da loucura.

É este mau costume que o Alienista deseja consertar, introduzindo a esquecida cidadezinha no século da ciência e da razão. Tão logo inicia sua empreitada, eis o que ocorre: uma verdadeira “torrente de loucos”. Eles surgem de toda parte - monomaníacos, loucos por amor, vítimas de mania de grandeza. E, diante da perplexidade geral, simbolizada pelo espanto ingênuo de Pe. Lopes, a quantidade de loucos só faz aumentar na medida em que oAlienista segue em seus estudos e amplia o poder de seus conceitos. No auge,
4/5 da população da cidade está trancafiada dentro dos muros da Casa Verde.

Mas isso não é tudo. Seguindo o curso da parábola, e em função das novas descobertas que faz, Simão Bacamarte desiste de buscar o germe da loucura nos outros, voltando-se para si mesmo como objeto de investigação.

“Reúno em mim mesmo a teoria e a prática”, conclui ele, descobrindo-se sujeito e objeto da ciência nascente. Desta forma, cessando a atividade produtiva da loucura por parte do Alienista, já não há loucos em Itaguaí. Ou há um só.

Parábola em três tempos.

Um: antes da intervenção do psiquiatra não existem loucos.
Dois: sua ação desencadeia uma torrente de loucos.
Três: saindo de cena o cientista, haverá no máximo um louco, ele próprio, que decide
assim se constituir.

Não está em questão, portanto, a natureza da loucura ou de alguma teoria científica. O texto é claro: não há em Itaguaí loucura alguma, exceto a daquele que a produz.

http://www.fflch.usp.br/sociologia/temposocial/site/images/stories/edicoes/v0512/Alienista.pdf

Meus queridos...

Sei que não é fácil ler Machado de Assis na adolescência, aliás nunca é fácil ler esse autor, porque ele nos desafia pelo vocabulário, pelas construções psicológicas brilhantes de personagens, por tramas bem construídas que temos que desvendar, enfim...por n motivos.Mas é assim que se constroem casas e pessoas, tijolo por tijolo.

Somos o que fazemos de nós e se podemos ser melhores por que nos contentarmos em ser medíocres? Portanto, você deve ler Machado porque MERECE O MELHOR...

A prova é circunstancial, mas o que você aprende é para sempre.( mesmo que você diga-hoje- que é"chato").

beijos...e Boa Prova!

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O Alienista IV








A exemplo de uma fábula,os acontecimentos aqui narrados  ilustram, simbolizam e criticam os valores da sua época

Simão Bacamarte, médico formado em Portugal, instala-se em Itaguaí, no interior do Rio de Janeiro com o objetivo de estudar a loucura e sua classificação. Ou como ele próprio dizia: "A ciência, é o meu emprego único; Itaguaí é o meu universo." Vem daí a sua idéia de confinar os loucos no mesmo local. 

Com apoio da Câmara Municipal, constrói um hospício, designado pelo nome de Casa Verde. Num primeiro momento, Bacamarte confina os loucos mansos, os furiosos e os monomaníacos, isto é, aqueles que a própria comunidade julgava perturbados. Num segundo momento, após muitas leituras e meditações científicas, o Dr. Bacamarte comunica a seu melhor amigo, o boticário Crispim Soares, a idéia de que "a loucura era até agora uma ilha perdida no oceano da razão;" e que ele começava a suspeitar que ela fosse um continente...

A partir de então o alienista (médico de alienados mentais) põe-se a levar para a Casa Verde cidadãos estimados e respeitados em Itaguaí. Pessoas aparentemente ajuizadas, mas que, segundo as teorias do cientista, revelavam distúrbios mentais. O terror se dissemina na pequena cidade. Ninguém mais sabe quem está são ou quem está doido. Atemorizados, os que ainda não tinham sido conduzidos para o hospício tramam uma rebelião.

A revolta dos Canjicas -

O barbeiro Porfírio, cujo apelido era Canjica, passa por cima da Câmara de Vereadores, que não ousa indispor-se com o alienista, e marcha à frente de uma multidão, rumo à Casa Verde. 

O levante popular - que mais tarde ficaria conhecido como a revolta dos Canjicas -devido ao apelido de seu lider - termina em frente ao hospício. O Dr. Bacamarte recebe a massa rebelada com a autoridade e a coragem do grande cientista que julga ser, deixando o povo perplexo com sua serena superioridade intelectual. Nesse momento, chegam a Itaguaí os dragões (soldados) do Rei, para restaurar a ordem. No meio da confusão, os dragões acabam aderindo aos revoltosos e a revolução triunfa, tendo o barbeiro Porfírio como chefe.

Em seguida, Porfírio procura o Dr. Simão Bacamarte e diz que não pretende mais destruir o hospício. Que bastava uma revisão nos conceitos de loucura do médico, liberando os enfermos que estavam quase curados e os maníacos de pouca monta. Que isso bastaria ao povo. O alienista ouve o barbeiro, fazendo-lhe algumas perguntas sobre o que tinha acontecido nas ruas e conclui que também o líder dos Canjicas estava louco, assim como aqueles que o aclamavam. Em cinco dias, o Dr. Bacamarte mete na Casa Verde cerca de cinquenta adeptos do novo governo, gerando outra grande indignação popular, que só termina quando entra na vila uma força militar, enviada pelo vice-rei.

A partir daí há uma "coleta desenfreada" para o hospício.A partir daí há uma "coleta desenfreada" para o hospício. Quase ninguém escapa. Tudo é loucura para o Dr. Bacamarte. O barbeiro, o boticário Crispim, o presidente da Câmara e a ...


Pois é , meninos e meninas , vale a pena ler o final.Essa história é uma crítica ao comportamento humano , à hipocrisia social ( falsidade) e mostra que , dependendo do ponto de vista que assumimos, a loucura e a razão podem ter muitas faces.

Ainda não acabou. O final é perfeito, vale a pena ler.

domingo, 17 de abril de 2011

O Alienista III


A história contada em O Alienista não existiu na realidade material. Desta perspectiva, ela é inverossímil. Porém, a literatura ficcional faz uso da imaginação para produzir uma narrativa, uma verdade e saber legítimos. O que lemos termina por apresentar aspectos verificáveis em personagens e instituições reais, como os hospícios, hospitais, seus loucos e doentes e os encarregados de instituírem a normalidade e curar. Ainda que não verifiquemos similitude plena entre a narrativa literária e a vida material real, ela nos oferece um saber, uma verdade, que nos permite pensar e questionar o real existente.
 “A arte da ficção cria um texto cuja alta concentração de energias permite a eclosão de uma verdade”, afirma Gomes (id.).

A literatura, como a ciência, também influi sobre a realidade. Sua presença é perceptível através, por exemplo, da influência de determinadas obras sobre as ações dos seus leitores.A literatura também interfere sobre a formação dos valores dos leitores, expressa épocas históricas determinadas e tem incidência social e política. Ela tanto pode contribuir para a consolidação do ideário conservador, quanto para o seu questionamento. Ela tanto pode fortalecer a elite cultural, na medida em que esta se apropria dos recursos e linguagem, constituindo um capital cultural que tem função distintiva, quanto pode favorecer a resistência aos valores capitalistas sedimentados no elitismo cultural. Dessa forma, a linguagem literária, vale afirmar, o saber produzido pela literatura, é fundamental.
Se o texto científico prima pelo formalismo, pela obediência a regras e procedimentos próprios que o caracterizam enquanto tal, o texto literário também segue convenções, mas é capaz de zombar e ir além delas. A literatura se fundamenta na imaginação criativa e, portanto, tem a capacidade de narrar qualquer coisa inerente ao existir humano, isto é, á sua potencialidade inata de pensar e criar. E neste exercício, a obra literária, “pode ridicularizar, parodiar qualquer ortodoxia, crença, valor, imaginar alguma ficção diferente e monstruosa” (CULLER, 1999:46). Talvez por isso os governos e a moral religiosa se vejam eternamente forçados a censurar e impedir que a imaginação humana alce vôos acima das suas estruturas autoritárias.
Para refletir...
O texto acadêmico pressupõe conclusões. Contudo, o objetivo não é o de apresentar elementos conclusivos, mas sim o de estimular a reflexão sobre a literatura enquanto outro saber legítimo e potencialmente crítico. Não se trata de fazer apologia à literatura, nem de contrapô-la ao saber científico, mas de simplesmente reconhecê-la como outro conhecimento humano merecedor das atenções e capaz de contribuir para pensarmos criticamente os valores predominantes na sociedade. Na medida em que uma obra como O Alienista nos permite refletir sobre o poder e a ciência, ela se mostra tão fundamental quanto qualquer texto doutoral fundado em argumentos científicos que tenha o mesmo caráter questionador.
Também não foi nossa intenção esgotar a análise do conto O Alienista na perspectiva adotada. Outros o fizeram e melhor... Almejamos, sim, resgatar o tema e os autores que nos permitam repensar a ciência, o poder e a literatura. Se o leitor nos acompanhou até aqui, já compartilhou desta inquietação e da reflexão sempre necessária sobre a ciência e o poder.Valeu a pena!

E tem mais...

domingo, 10 de abril de 2011

O Alienista II -


Estrutura da obra

Treze capítulos, centrado em crônicas históricas sobre a cidade .

Foco narrativo
O narrador é em 3ª pessoa, onisciente. A  sua intenção  é a análise do comportamento humano: vai além das aparências e procura atingir os motivos essenciais da conduta humana, descobrindo, no homem, o egoísmo e a vaidade. A intencionalidade crítica do narrador não se reflete somente ao ser humano de forma geral. Ele critica, também, a postura do cientista e do extremo cientificismo do final do século XIX.

Tempo
Toda a história se desenvolve no passado, havendo o uso do flashback: "As crônicas da Vila de Itaguaí dizem que, em tempos remotos, vivera ali um certo médico: o Dr. Sr. Bacamarte."O tempos remotos" a que se referem as crônicas, pelas indicações dadas, se remontam à primeira metade do século XVIII ( reinado de D. João V). A ação transcorre, como já se viu, em Itaguaí, "cidadezinha do Estado do Rio de Janeiro, comarca de Iguaçu".

Espaço :
 a cidadezinha de Itaguaí- RJ 
 a Casa Verde ( o manicômio)

Personagens :
 Dr. Simão Bacamarte: o protagonista da estória. A ciência era o seu universo – o seu "emprego único", como diz. "Homem de Ciência, e só de Ciência, nada o consternava fora da Ciência" . Representa bem a caricatura do depotismo cientificista do século XIX (como está no próprio sobrenome). Acabou se tornando vítima de suas próprias idéias, recolhendo-se à Casa Verde por se considerar o único cérebro bem organizado de Itaguaí.

b) D. Evarista:  a eleita do Dr. Bacamarte para consorte de suas glórias científicas. Embora não fosse "bonita nem simpática", o doutor a escolheu para esposa porque ela "reune condições fisiológicas e anatômicas de primeira ordem, estando apta para dar-lhes filhos robustos, são e inteligentes" (p. 179). Chegou a ser recolhida à Casa Verde, certa vez, por manifestar algum desequilíbrio mental.

c) Crispim Soares: o boticário. Muito amigo do Dr. Bacamarte e grande admirador de sua obra humanitária. Também passou pela Casa Verde, pois não soube "ser prudente em tempos de revolução", aderindo, momentaneamente, à causa do barbeiro.

d) Padre Lopes: o vigário local. Homem de muitas virtudes, foi recolhido também à Casa Verde por isso mesmo. Depois foi posto em liberdade, porque sua reverendíssima se saiu muito bem numa tradução de grego e hebraico, embora não soubesse nada dessas línguas. Foi considerado normal apesar da aureola de santo.

e) Porfírio, o barbeiro: sua participação no conto é das mais importantes, posto que representa a caricatura política na satírica machadiana. Representa bem a ambição de poder, quando lidera a rebelião que depôs o governo legal. Foi preso na Casa Verde duas vezes; primeiro, por ter liderado a rebelião; segundo, porque se negou a participar de uma segunda revolução: "preso por ter cão, preso por não ter cão" .

Outros figurantes aparecem no conto. Cada um representando anomalias e possíveis virtudes do ser humano.

sábado, 2 de abril de 2011

O Alienista :vale a pena se envolver.

Machado de Assis em fase de plenitude.
A história contada em O Alienista não existiu na realidade material. Desta perspectiva, ela é inverossímil. Porém, a literatura ficcional faz uso da imaginação para produzir uma narrativa, uma verdade e saber legítimos. O que lemos termina por apresentar aspectos verificáveis em personagens e instituições reais, como os hospícios, hospitais, seus loucos e doentes e os encarregados de instituírem a normalidade e curar. Ainda que não verifiquemos similitude plena entre a narrativa literária e a vida material real, ela nos oferece um saber, uma verdade, que nos permite pensar e questionar o real existente. “A arte da ficção cria um texto cuja alta concentração de energias permite a eclosão de uma verdade”.
A literatura, como a ciência, também influi sobre a realidade. Sua presença é perceptível através, por exemplo, da influência de determinadas obras sobre as ações dos seus leitores.A literatura também interfere sobre a formação dos valores dos leitores, expressa épocas históricas determinadas e tem incidência social e política. Ela tanto pode contribuir para a consolidação do ideário conservador, quanto para o seu questionamento. Ela tanto pode fortalecer a elite cultural, na medida em que esta se apropria dos recursos e linguagem, constituindo um capital cultural que tem função distintiva, quanto pode favorecer a resistência aos valores capitalistas sedimentados no elitismo cultural. Dessa forma, a linguagem literária, vale afirmar, o saber produzido pela literatura, é fundamental.
Se o texto científico prima pelo formalismo, pela obediência a regras e procedimentos próprios que o caracterizam enquanto tal, o texto literário também segue convenções, mas é capaz de zombar e ir além delas.
 A literatura se fundamenta na imaginação criativa e, portanto, tem a capacidade de narrar qualquer coisa inerente ao existir humano, isto é, á sua potencialidade inata de pensar e criar. E neste exercício, a obra literária, “pode ridicularizar, parodiar qualquer ortodoxia, crença, valor, imaginar alguma ficção diferente e monstruosa” (CULLER, 1999:46). Talvez por isso os governos e a moral religiosa se vejam eternamente forçados a censurar e impedir que a imaginação humana alce vôos acima das suas estruturas autoritárias.
 O ALIENISTA
 Publicado no jornal A ESTAÇÂO entre 1881 e 1882, a temática central conduz o leitor a uma eterna reflexão sobre os limites entre a insanidade e a razão; o poder da palavra, a loucura da ciência e as relações estabelecidas na sociedade do período. Neste caso, ao utilizar a questão da loucura enquanto uma alegoria, o conto machadiano encerra novas possibilidades de estudo, por ser um relato que apresenta ao leitor os rituais de subserviência, bajulação e clientelismo presentes no Brasil em finais do século XIX. Em contrapartida, o texto questiona o poder das teorias científicas evolucionistas, positivistas e sócio-darwinistas trazidas da Europa que, neste momento histórico, indicariam as respostas para todos os males desta civilização em busca do progresso.
Em linhas gerais, o conto (dividido em treze capítulos) apresenta a cidade de Itaguaí; e como a chegada do médico Simão Bacamarte, apresentado enquanto o “... filho da nobreza da terra e o maior dos médicos do Brasil, de Portugal e das Espanhas...” (p.273) , modificaria as relações existentes valendo-se do poder conquistado através da utilização dos experimentos e pensamento científico.
No primeiro momento, nos deparamos com a personalidade científica de Simão Bacamarte presente mesmo na escolha da sua esposa “....D. Evarista era mal composta de feições, longe de lastimá-lo, agradecia-o a Deus, porquanto não corria o risco de preterir os interesses da ciência na contemplação exclusiva, miúda e vulgar da consorte”.(p.273-274). Com essa afirmação, o autor reforça a idéia do conto enquanto uma paródia ao cientificismo presente nas idéias transplantadas para o Brasil, através dos representantes da elite local, como o Simão Bacamarte, que desenvolveram seus estudos na Europa.
Dessa maneira acompanhamos a criação da Casa de Orates, ou Casa Verde, onde o alienista define o seu objetivo “O principal nesta minha obra da Casa Verde é estudar profundamente a loucura, os seus diversos graus, classificar-lhe os casos, descobrir enfim a causa do fenômeno e o remédio universal.” (p.277).
Durante o processo de seleção e classificação dos loucos, que serão vários durante a estória, notamos outra face do conto, dentre os alienados percebemos os loucos “por amor”, os com mania de grandeza que recitavam toda a sua genealogia, ou faziam discurso em latim e grego, os casos de monomania religiosa entre tantos outros . Assim, o asilo se transforma não somente em um local de enclausuramento dos loucos mas um retrato da sociedade vigente com seus extratos sociais delimitados e classificados.
 ( continua...)