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quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Qual é a terceira margem do rio?

Analisando a obra;

Narrado em primeira pessoa e é o mais famoso e o mais aberto conto do autor.


Tempo
O tempo cronológico é de um longo período, toda a vida do narrador. Mas a intensidade com que as impressões e o amadurecimento do narrador são mostrados enfocam o  tempo psicológico.

Espaço
O espaço é delimitado pela presença concreta do rio, caracterizando a paisagem rural  Desse espaço emanam magia e transcendentalismo aos olhos do leitor, no ir e vir do rio e da vida.

Personagens
Os personagens são: filho (narrador-personagem),
pai (“virara cabeludo, barbudo, de unhas grandes, mal e magro, ficado preto de sol e dos pêlos, com aspecto de bicho, conforme quase nu, mesmo dispondo das peças de roupas que a gente de tempos em tempos fornecia”),
 mãe, irmã, irmão, tio (irmão da mãe), mestre, Padre, dois soldados e jornalistas.

Esses personagens, sem nomes, acabam se caracterizando como tipos sociais, por suas funções na história. A observação desse aspecto já mostra, no pai, a tendência ao isolamento. Sempre fora a mãe a responsável pelo comando prático da família. O pai, sempre quieto. O filho e narrador não foi aceito na infância para companheiro do pai no seu desafio. Na maturidade, quando tem a oportunidade, acha não estar preparado para ir rumo ao desconhecido, ao "inominável".

Recursos de estilo
Toda essa estranha história vem vazada no já comentado estilo típico de Guimarães Rosa. A oralidade é reproduzida na fala do narrador: "Do que eu mesmo em alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, conhecidos nossos. Só quieto. Nossa mãe era quem ralhava no diário com a gente."

As frases, curtas e coordenadas, independentes, garantem um ritmo lento e pausado à leitura: "Ele me escutou. Ficou em pé. Manejou remo n'água, proava para cá concordando".

A repetição também é um recurso expressivo comum ao autor, como no caso: e o rio-rio-rio, o rio sempre fazendo perpétuo.

Neologismos também estão presentes ("diluso", talvez variante de diluto, diluído; ou "bubuiasse") ao lado de termos regionais como "trouxa", no sentido de comida e roupas, típico no falar dos boiadeiros; além de outras palavras pouco comuns: encalcou, entestou etc.

As figuras de linguagem reforçam o lado poético do conto como exemplificam a gradação "Cê vai, ocê fique, você nunca volte!", a antítese "perto e longe de sua família dele", além do próprio caráter metafórico do rio.

Sem dúvida, todos esses recursos geram dificuldade ao leitor que desafia a obra rosiana. Mas, uma vez enfrentados, eles permitem o acesso ao mundo do "encantatório", ao mundo do desconhecido, da terceira margem, que só poderia ser recriado por uma linguagem também recriada e nova, capaz de refletir todo o deslumbramento desse universo.

A temática deste conto é a loucura.

Desde o título, o leitor já depara com o insólito da obra rosiana: o que vem a ser a terceira margem do rio? A expressão provoca o entendimento a fim de despertá-lo para o mundo do inconsciente, do abstrato. A terceira margem é aquilo que não se vê, que não se toca, que não se conhece.

O pai, ao ir à procura da terceira margem do rio, busca o desconhecido dentro de si mesmo; o isolamento é a única maneira encontrada para procurar entender os mistérios da alma, o incompreensível da vida. A estranha história do homem que abandona sua família para viver em uma canoa e nunca mais sair dela é o argumento exemplar usado pelo autor para discorrer sobre o medo do desconhecido.

O rio sempre teve destaque na imaginação do autor:

[…] amo os grandes rios, pois são profundos como a alma do homem. Na superfície são muito vivazes e claros, mas nas profundezas são tranqüilos e escuros como os sofrimentos dos homens. Amo ainda mais uma coisa de nossos grandes rios: a eternidade. Sim, rio é uma palavra mágica para conjugar a eternidade.

Guimarães Rosa



Um aspecto interessante a ser notado é que o narrador, quando criança, queria embarcar com o pai. Este o impediu. Adulto, intui o porquê da busca do pai e, chegando-se à margem do rio, diz que quer substituí-lo. É o único momento em que o velho se manifesta, indo em direção à margem. No entanto, o narrador fica com medo da imagem do pai, que parecia vir do outro mundo. Foge. Por isso, torna-se a única personagem fracassada, pois não foi capaz de transcender, de realizar seu salto.

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